sábado, 17 de fevereiro de 2018

AMOR À PÁTRIA: morre mais quem por ela mata.

Amar à Pátria virou moda: vestimos este amor quando estamos em determinado grupo, em determinado espaço ou representando algum papel. Logo mais, na presença do nosso próprio "eu", quando estamos "sozinhos", mostramos o nosso verdadeiro lado: jogamos lixo nas ruas, furamos fila, não devolvemos o troco em excesso, avançamos o sinal vermelho, desejamos o mal...


Estamos aprendendo mais a nos comportar como juízes do que como seres humanos. Julgar, antes mesmo de ser entendido como uma questão de extrema seriedade, tem sido entendido como uma condição de vida ao sujeito: é como se julgar o outro fosse a garantia de manutenção da nossa liberdade.

Errado! O julgamento (o julgamento social), quando praticado por não juízes ou não juízas, tende a viciar o sistema judiciário: ele se aproveita da nossa incapacidade de generosidade ao próximo e excede os seus próprios limites julgando somente àquilo que lhe interessa.

Ser um bárbaro, segundo a etimologia da palavra de origem grega, significa "aquele que é estrangeiro", "aquele que não sabe a língua da cidade". Bárbaro, para nós, significa aquele que pratica absurdos, como crimes horríveis contra a vida.

Ouso dizer que temos sido os dois tipos de bárbaros: ora somos estrangeiros do nosso próprio meio, e por isso mesmo não entendemos a língua do nosso contexto, para em seguida, tão logo, praticarmos excessos como a disseminação do ódio e a prática de violência.

Temos amado pouco - e não nos restam dúvidas disso! Publicamente temos amado muito, tanto, desesperadamente em excesso; na intimidade temos detestado, estamos sendo hostis e desprezíveis - estamos apaixonados pela falsidade. Colocamos a culpa no amor, no zelo, na ausência de controle por tanto descaso com a vida - estamos em crise.

Existem contextos em que já nascemos em clima de conflitos, altamente violentos e, nestes, há mais vítimas do que culpados; em outros, tudo é mais digerível, poucas dificuldades e poucos problemas: nestes, somos praticantes dolosos da nossa insatisfação com o diferente (somos, digamos, cruéis).

Precisamos valorizar o direito à liberdade que é um direito de todos (concordo)! Mesmo assim, precisamos compreender que a nossa liberdade não pode significar a invasão do espaço alheio.

Somos livres para odiar, para causar problemas, para praticar violências. Quem disser o contrário estará simplificando demais o conceito de liberdade, porque de fato podemos tudo isso o que foi dito no período anterior. Querem uma prova? Agora, neste instante, o que te impede de quebrar um prato de vidro ou de sentir ódio pelo árbitro que não marcou um pênalti a favor do seu time? Avançando: o que te impede de sair com o carro, acelerar o máximo que puder e colidir na traseira de um outro carro? O que te impede de mergulhar num rio lotado de jacarés? E de saltar de um avião sem qualquer tipo de equipamento? Na hipótese de que você tenha um prato de vidro, torça para um time, tenha um carro, um rio acessível e lotado de jacarés ou esteja a bordo de um avião digo que nada além da tomada de decisão seja suficiente.

Só decidimos nos prejudicar na medida em que estamos cada vez mais adoecidos, mais afastados da sensibilidade da vida e dos aromas contidos na paz. Quando adoecidos, não é incomum que adoeçamos os outros que nos cercam - é quando nos apaixonamos pela infelicidade, pelo pessimismo absoluto, pelo horror que é o medo em aceitar o sucesso das pessoas que têm histórias diferentes das nossas.

É por isso que falamos do amor à Pátria logo no começo e confrontamos esse amor com a nossa capacidade de nos enganar. Este amor é um amor falso na maioria dos casos, e em outras condições ele tem sido doentio.

Como seria possível acreditar naquele que escreve ou diz na mesma frase que "por amor à Pátria é preciso matar", por exemplo? Qual é o amor que mata? Pelo visto, só se ama o desconhecido (ou o diferente) em campanha publicitária ou em ação social!

A tomada de decisão é fundamental para que possamos nos assumir pessoas justas ou perversas! Se você diz que luta por um espaço mais digno, por uma cidade mais justa, lembre-se quantas vezes hoje você já foi indigno ou injusto consigo, com a natureza ou com o próximo até aqui. Lembre-se do lixo nas ruas, do furar fila, do troco em excesso, do sinal vermelho e pense em quantas pessoas já foram atingidas pela sua intolerância.

Amar à Pátria virou moda; moda é  sempre negociável (sempre possui um preço); e comprar sem reflexão é a nossa maior especialidade - levamos o ódio gratuitamente e, demasiado carentes, pagamos para não levar o amor ou pagamos para impedir que ele nos leve.

Somos medidos pela nossa ignorância, não pela nossa compaixão. E, se tenho me envergonhado do ser humano, não é por ausência de um espelho, mas, por cansaço, por desânimo, por ter quase destruído todo o meu repertório de palavras que há tempos anda dizendo: "Mais amor, pelo amor, por amor, POR FAVOR!"

Por Diego Muniz


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